segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Fernando ...

“I know not what tomorrow will bring” (Fernando Pessoa  – last words)

Lisboa ficou como um pano de fundo, de onde ele criou universos, na modernidade dos significados que ele deu às palavras, dos sentidos diversos que a vida contemporânea pode ser. A estátua que tantos turistas visitam é um ícone pop, uma lembrança fugaz, não bebida na pele, não adormecida na essência da fragmentação que o mundo contemporâneo se tornou. 

A modernidade fez-nos perder uma ideia segura do mundo, uma possibilidade de construir linhas, capazes de nos devolver uma segurança, uma ideia de futuro. Explodiram ideias, conceitos, crentes, descrentes, todas as formas razoáveis e indignas de sermos algo que nos chame de humanidade. Vestimos hábitos para os quais não estávamos habilitados, desistimos do que melhor sabíamos e de cada vez que sorrimos na multidão, uma abordagem funcionária fez-nos esconder dentro do mais puro de nós. Vestimos máscaras que não nos deram vida e quando reparámos estávamos velhos e consolados de indiferença. Somos pois testemunhas de uma fragmentação de eus, e vivemos entre o excesso de escolhas, mal formuladas, dedicadas em discursos de nevoeiro por iluminados de ocasião e um vazio. 

Perdemos a voz dos deuses e ficámos estilhaçados, convencidos que em cada eu construíamos um mundo de desejos e de sucessos. Ao debatermos a unidade perdemo-la, como crianças, expulsas da magia da fantasia. É esta uma das grandes forças de Fernando Pessoa. A sua heteronímia levanta de um modo único a luta entre esse interior que se perdeu em espectáculos de excesso, de horizontes de vazio. Na fractura interior que a contemporaneidade trouxe, os eus são essa tentativa de alcançar uma unidade que não conseguimos ter, e por isso ele tanto nos disse sobre essa dificuldade de respirar, de existir no “intervalo que há entre mim e mim”.  

Todos os seus heterónimos são essa forma criativa e humana de chegar ao universo e perante ele obter uma resposta. A sua poesia é a busca de uma metafísica, capaz de fazer pensar quais as formas possíveis de existir, que particulares somos. Em Alberto Caeiro «Falaram-me os homens em humanidade. Mas eu nunca vi homens nem vi humanidade. Vi vários homens assombrosamente diferentes entre si. Cada um separado do outro por um espaço sem homens.», em Ricardo Reis «Da verdade não quero mais que a vida; que os deuses dão vida e não verdade, nem talvez saibam qual a verdade.”, em Álvaro de Campos «És importante para ti porque só tu és importante para ti. E se és assim, ó mito, não serão os outros assim?”, notamos essa necessidade de expressão individual, de pluralidade de possibilidades. 

Pessoa representa esse encontro para analisar e pensar a modernidade no homem. Pensarão os turistas e o país pop e o outro, feito de modos funcionários, o que significa este homem na cultura universal, além de fotografias e sorrisos de plástico momentâneos? Pessoa é ainda e sempre a grandeza de quem viu que o pensamento é o motor maior de qualquer inteligência feita sociedade, ou conjunto de pessoas.

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