segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

In Memoriam - Mário Soares (1924-2017)

A História não é uma narrativa que se escreva no espaço em que decorre, no momento em que as ondas fazem circular o tempo, dando-lhe um movimento, mas ainda não o explicando. A História é uma construção analítica sobre fontes e documentos, sobre o corpo de uma sociedade, sobre todas as histórias que fizeram a vida das pessoas. A História é uma desconstrução que pretende trazer todas as vivências de mil vidas para o horizonte do que se pode conhecer. Por isso é feita por todos. Este não é ainda o momento para essa análise detalhada do que foi o Portugal nas últimas duas / três décadas. É o momento para falar de um homem que partiu e do valor da memória coletiva.

Existem pessoas, muito raras que sobre o corpo da sociedade têm uma ideia, um sonho de construir algo que possa ser mais belo. Pessoas que sabem ler o tempo curto e pensar um tempo longo, onde possíveis transformações podem ocorrer. Pessoas que transportam um ideal e o fazem desabrochar nos outros,  na sua cumplicidade, nos desejos mais íntimos. A liberdade é o sentido maior de cada um, pois nele se forma a sua própria identidade. Quem descobre essa possibilidade para dias melhores é um homem raro.

Mário Soares foi esse homem. Teve um ideal de liberdade, compreendeu o fim tardio do Estado Novo e propôs-se com outros a denunciar o seu cinzentismo. Soube compreender o que era preciso construir após a manhã gloriosa e teve o engenho para escolher o mais prudente. E do futuro teve sempre uma ideia que seria melhor se fosse feito em liberdade e num sentido democrático da vida.

Não é verdade que fosse amado por todos. Os saudosistas não acharam piada à abertura de uma caixa de Pandora, alguns não lhe reconheceram o seu sentido de liberdade, as suas opções. Elas foram sempre fraturantes para algo diferente. O fim do Estado Novo, a descolonização, o Estado de natureza democrática e um sentido liberal da economia em muitos contextos. 

Mas a dívida do País, se ela pode ser dirigida apenas a uma pessoa é significativa. Como estrangeirado trouxe uma ideia de alegria, de cor, de festa a um País triste. O País ainda está longe dessa alegria. Como ele diria, - o amanhã pode ser sempre melhor. Depende de nós. Afinal foi esse o seu maior feito. Dar uma ideia que pode ser desenvolvida por todos nós, pois um País  é uma comunidade e que essa inspiração depende da nossa  vontade.

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