terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Memória, cidadania e cultura - O Holocausto - Explicar o inexplicável

«As guerras podem ser causadas por indivíduos fracos ou cretinos do ponto de vista moral, mas são combatidas e suportadas por gente muito decente» (1)

Se a cultura é a acumulação de ideias e valores que organizam uma Nação, os padrões civilizacionais de um Povo, a da Alemanha foi na História Contemporânea das mais intensas da Europa. No país de Gothe, Einstein, Beethoven, de Kurt Weill o património acumulado nas artes, no pensamento, era simbólico para a cultura europeia. Neste sentido como explicamos essa doença maligna em que o espírito humano se quebrou perante os mais nefastos fantasmas, o Nazismo.

Aquele foi o regime onde se assistiu à maior regressão da história humana. O Nazismo foi a confirmação de uma sociedade sem princípios racionais, assente nos mais nefastos instintos, o culto irracional pelo ódio e pela morte. Foi a consagração de uma religião incompreensível da loucura, onde a perda da vida uma etapa banal na conquista do poder e da glória.

E no entanto, foi um regime com assinaláveis vagas de popularidade. Antes dos fantasmas emergirem da noite para a mais clara luz, o Fuhrer chegou a ser considerado pessoa muito respeitável. De aparência em aparência o regime conquistou adeptos. A verdade difícil, cruel, trágica é que milhões de alemães acreditaram na causa nazi e muitos, demasiados jovens morreram pelo seu Fuhrer. Houve opositores ao regime nazi? Sim, mas proporcionalmente foram poucos. Como explicar este dilema?

Todas as respostas serão insuficientes, ingratas, insatisfatórias, incompletas de sentido para explicar a emergência do Mal absoluto. As condições do tratado de Versalhes, a crise económica e social, o desemprego, a inflação, a crise monetária, a derrota alemã em 1918, a psicologia teutónica tudo é pouco para justificar esta contradição. Quando se comemora o dia do Holocausto é necessário refletir sobre esta esta enigmática e cruel realidade. É uma oprtunidade para analisar a genialidade do mal. Custa admiti-lo, mas o Mal também pode ser servido por génios. A História como disciplina ignora muitas vezes o papel do indivíduo, integrando-o em grandes movimentos. Este é um caso em que um indivíduo servido por uma  ideologia irreconhecível, uma máquina de propaganda, condições históricas particulares e uma psicologia e filosofias únicas soube criar a maldade extrema na sociedade humana.

É fundamental perceber isto. É decisivo compreender como a cultura e a história se relacionam e como o discurso da cultura muitas vezes já o é ao serviço de ideologias transformando-se apenas em propaganda. Aqui se compreende como a História como disciplina oferece possibilidades formativas para que a sociedade evolua em todos os sentidos, naquilo que é a dignidade humana.

A História não se repete nas formas, mas pode voltar noutras condições oferecer uma igual falta de dignidade para a Humanidade. Só discutindo o mal se pode estar atento e preparado. É essencial pensar nos mecanismos do poder, no controle feito sobre o indivíduo, na desvinculação social, nas respostas únicas. De Heidegger, a Sartre, quantos "bons" filósofos não estavam inconscientes, para com o mal absoluto, em tantos regimes do século XX, que não sabiam reconhecer o outro como pessoa.

(1) Testemunho de pilloto da Luftwaffe,
citado em A Vida Perdida de Eva Braun

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