sexta-feira, 12 de junho de 2015

Semana das Artes - Ilustração / Textos (IX)

O mar está dentro de mim. Nas minhas veias, é ele que corre e não sangue; as minhas lágrimas são água salgada. A minha alma é um rio. A minha raiva, um temporal. A minha serenidade, um lago. (Em Alqueva, os mortos estão debaixo de água.) Amo todos os sítios do mar. O meu povo não é, não, este que aqui vedes. Meu povo é o gentil do oceano, é esse que canta canções de sereia, sem ser mau, e não entende, nem quer entender, os mistérios e as maldades da terra. (Entre os cavalos-marinhos, um cemitério. Ao pé das algas castanhas, grandes do tamanho do mundo, uma escola. Ali, no banco, carcomido pela água, conheci eu a minha mulher.) 
Há uma razão muito clara e muito evidente para ser o mar azul e a terra castanha: é que o mar é purificação, inocência, primordial essência e a terra é casa de pecado, é gases, é dissimulação. Sujam meu oceano só de o imaginarem. A água é o meu lar. Quando chove, estendo a cara ao firmamento e é esse o meu amor. Sei que o mar também me ama. Habito nas tuas grutas, habito nas tuas falésias e a minha vida é olhar-te e rezar para que nunca sejas corrompido. Rezo à baleia e rezo ao polvo. 
Não sei quem são esses deuses sangrentos da terra nem me importo com eles. (Que fazes aqui, mergulhador? Não é bom que aqui estejas…) Amo-te mar; a palavra mar está na palavra amar. O meu suicídio é o deserto. Recebe-me na maré-cheia, na seca, nas ondas, e recebe-me também no gelo. 
Acolhe-me em ti porque a água é o meu sangue e o meu quarto não tem teto para poder sentir-te quando vens. Se os meus olhos fossem de alguma cor que não azul, pintava-os em pinceladas fingidas de Turner. Da minha boca só saem palavras salgadas e as pessoas da terra não entendem o que não é doce ou ácido. Das minhas mãos só se vêem as tuas transparências. As minhas unhas são basaltos. (Vim ver a minha mulher.) Tu secares é eu secar. (O banco verde permanece sozinho à beira da barragem. Nada há entre ele e a água). Prometo que o mar corre dentro de mim.

Texto: | Sofia Sequeira|11ªB|
Desenho:|Caetana F. Thomaz|12ºD| 
Escola Secundária Rainha Dona Amélia|Semana das Artes |


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