sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Novidades na Biblioteca - Livros (III)

  
Em As velas ardem até ao fim, Sándor Márai dá-nos uma obra-prima, que entre a delicadeza dos gestos criados, usa uma linguagem que emerge para nos revelar a solidão do homem no tempo, os mecanismos supérfulos do poder, os laços que tentamos construir contra os estranhos que em nós moram. É uma narrativa fluida de sabedoria, de desconstrução dos tons obscuros em que as paixões humanas dissolvem as mais belas promessas de beleza e harmonia. 
É a história de uma amizade, de uma paixão e a descrição de um mundo, do seu ocaso, das suas figuras e de um real com os objectos que permitem a ordem no fim de um tempo. É ainda o testemunho de uma construção aristocrática, onde o silêncio e a ordem guardavam  os limites de um mundo construído de compromissos mútuos, dos que outorgam poder e dominação, pelo que conhecemos ou o que não sabemos decifrar. 
É no fim, um livro sobre a amizade, essa superior forma de criar laços, sem o desconcerto do amor e das suas manifestações menos harmoniosas. E nesses laços, como separamos a respiração que não nos envolve, o gesto que atraiçoa o que sempre amamos? Pode a solidão e o silêncio das pedras, o abraço da cidade e os olhos da multidão, entre os sorrisos que nos são devolvidos, voltar a reconstruir o momento inicial? 

E se não fôssemos amigos, tu não terias regressado quarenta e um anos depois, outra vez como assassino e malfeitor que volta furtivamente ao local do crime. Porque tinhas de regressar, como vês. E agora tenho de te dizer algo de que me dei conta só pouco a pouco, não acreditava nisso, negava diante de mim mesmo, tenho de te confessar essa surpresa e revelação terrível: tu e eu ainda continuamos a ser amigos. Parece que nenhuma força exterior pode mudar as relações humanas. Tu mataste algo em mim, destruíste a minha vida e eu continuo a ser teu amigo. (...) A amizade é uma lei humana rigorosa. Na antiguidade era a lei do mais forte, nela se baseavam os sistemas jurídicos das grandes civilizações. Para além das paixões e do egoísmo vivia essa lei, a lei da amizade, nos corações humanos.

Lusco-fusco é um livro de Cristina Carvalho que se integra no campo da literatura juvenil. É um livro sobre os elementos que encontramos na Natureza e o modo como os reconhecemos, como os "vemos", como somos capazes de os encontrar e que qualidades precisamos evidenciar. Os elementos naturais são no fundo o conjunto dos espíritos da Natureza. São personagens etéreas, misteriosas, por vezes possuidoras de algum perigo. São os gnomos, as fadas, as salamandras e outros seres que vivem ou nas profundidades da Terra, ou no fundo do mar. São os fenómenos que abalam o  mundo, os terramotos, os furacões, os vulcões. É o reino dos quatro elementos.

Esta história não se pode chamar história.
É uma descrição de pessoas e seres, de lugares e de situações que não existem, nunca existiram.
Quero, apenas, entreter-vos numa qualquer altura da vossa vida. Fazer com que as sombras e os desenhos que nos aparecem por detrás das pálpebras ganhem um significado; fazer com que aquelas manchas de luz, normalmente duma intensa cor branca, aproximando-se, afastando-se e desfazendo-se, sempre por detrás das nossas pálpebras quando fechamos os olhos num belo dia de sol, adquiram algum significado.
Nada mais.
Nada do que aqui se conta aconteceu.
As descrições mais ou menos humanas e antropomórficas das personagens pertencem a um imaginário coletivo que se perde no tempo e as entidades a que me refiro sempre foram vistas e apreciadas do mesmo modo: as fadas como sendo criaturinhas minúsculas e ariscas providas de asas; as sereias às metades, tronco de mulher e, da cintura para baixo, um rabo de peixe; os gnomos, pequeníssimos seres semelhantes a homens e a mulheres mas com orelhas pontiagudas, e por fim as salamandras, as misteriosas salamandras de quem nunca ninguém se atreveu a fazer grandes descrições.
Todos nós conhecemos desde que nascemos, pois as suas histórias têm vindo a ser contadas por tempos e tempos infinitamente antigos. Todos nós sabemos dos Quatro elementos. E também todos nós sabemos dos Quatro Reinos.


Manuscrito revisto pelo seu autor em apenas algumas das suas páginas, Eça de Queirós deu-nos em A cidade e as serras, um livro marcante da literatura contemporânea. Ele revela-nos a universalidade de Eça e desmistifica algumas das ideias feitas sobre o autor de Os Maias. Formado em Direito, integrando uma carreira diplomática por diferentes países, compreendeu de uma forma profunda o que era substancialmente Portugal. Soube compreender a ondulação que fazia a onda maior, dando-nos páginas de análise dos costumes, dos hábitos e das instituições e de como estas formavam um País adiado de si próprio. Em As cidades e as serras, Eça dá-nos descrições naturalistas de grande significado, revelando-nos ter sido mais do que um crítico de costumes. Aqui revemos uma terra, uma cultura e uma memória em diálogo consigo própria.

A cidade e as serras propõe-nos um diálogo puramente actual que é o do Homem, o sentido que a sua vida poderá ter. Diálogo entre uma sociedade urbana, feita de conforto, onde a civilização se assume como um repositório de inovações técnicas e uma sociedade em comunhão com a Natureza. Diálogo entre a cidade, domínio de uma grandeza técnica, mas afastada do coração do Homem, da sua harmonia, pois é nela que a liberdade moral se perde e um campo que sublima os sentimentos humanos de uma forma genuína. Era na cidade, que Jacinto no seu palácio de conforto e civilização vivia um mundo que o aborrecia. A cidade parece pois incapaz de conceber a felicidade humana - entre a dependência das modas, a pobreza dos rendimentos do trabalho e os rituais esquecidos. A cidade produtora de uma imensa indiferença, a maçada da vida. Com o campo Jacinto e nós descobrimos a natureza, a serra, uma das suas formas sublimes e nela um outro sentido para a vida - a comunhão com o Universo. A unicidade do Universo em formas múltiplas, leva-nos a compreender o homem, os animais, as plantas e os minerais.

É pois na Natureza que se descobre a diferença, o movimento animado de uma vontade que se expressa em formas de uma beleza rara. A que é feita de contemplação e de um silêncio que absorve a luz leve entre as folhas, onde nenhum pensamento outorga uma imanente felicidade. A cidade e as serras acaba por ser um manifesto naturalista, desenhando com um século de antecedência "o mal" da cidade encerrada em si e nas ligações à exploração individual. Eça dá-nos já o que será a desumanização das relações sociais que na cidade se evidenciam. É assim um livro de uma grande beleza, pelas suas descrições do Douro, das relações sociais no Portugal de oitocentos, do enquadramento temporal e pela oferta de uma possibilidade, que a cada dia mais carecemos. A Natureza como forma e expressão de satisfação e de encontro, com o mais importante - a beleza. É nela que desenhamos com harmonia a nossa respiração e a graça que nos envolve. É na Natureza que descobrimos o melhor de nós, as janelas que fazem nascer o sol com todas as possibilidades.

E nada mais instrutivo e doloroso do que este supremo homem do século XIX, no meio de todos os aparelhos reforçadores dos seus órgãos, e de todos os fios que disciplinavam ao seu serviço as Forças Universais, e dos seus trinta mil volumes repletos do saber dos séculos - estacando, com as mãos derrotadas no fundo das algibeiras, e exprimindo, na face e na indecisão mole de um bocejo, o embaraço de viver! (...)
Em fila começámos a subir a serra. A tarde adoçava o seu esplendor de estio. Uma aragem trazia, como ofertados, perfumes das flores silvestres. As ramagens moviam, com um aceno de doce acolhimento, as suas folhas vivas e reluzentes. Toda a passarinhada cantava, num alvoroço de alegria e de louvor. As águas correntes, saltantes, luzidias, despediam um brilho mais vivo, numa pressa mais animada. Vidraças distantes de casas amáveis flamejavam com um fulgor de ouro. A serra toda se ofertava, na sua beleza eterna e verdadeira.

Novidades na Biblioteca - Filmes (III)

  
Meia- Noite em Paris é um filme de 2011 de Woody Allen, que nos conduz à cidade de Paris. Nela observamos a narrativa de um casal americano à procura dos encantos da cidade luz. No seu percurso por Paris, Gil Pender, um roteirista de Hollywwod, faz uma viagem no tempo à descoberta dos escritores que se inspiraram nessa cidade. Redescobre os anos 20, contactando figuras como Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, Picasso ou Luís Buñuel. Filme sobre a arte, sobre a procura da beleza em aspetos do quotidiano e de uma simplicidade que nos traga um sentido substantivo da vida. Meia- Noite em Paris é  a busca de algo que sempre falta na vida de cada um, uma certa ilusão sobre a vida dos outros e aquilo que sentimos falta. É um filme que faz sobre Paris o que Manhattan fez sobre Nova Iorque, uma declaração de amor por uma cidade enigmática. 

Crimes e Escapadelas, é um filme de 1989 realizado igualmente por Woody Allen, que se enquadra na lista dos seus filmes que procuram fazer uma leitura filosófica da vida. Em Crimes e Escapadelas narra a vida de um homem de grande sucesso pessoal e social, um reputado oftalmologista, pilar de uma comunidade judaica, que se envolve numa relação extraconjugal e que pelos problemas criados aceita uma solução radical proposta pelo seu irmão, a morte da amante. Paralelamente uma outra narrativa é-nos oferecida, a de Cliff Stern, desempenhado pelo próprio Woddy Allen, um produtor de documentários e que procura manter a sua integridade intelectual. Filme de algum pessimismo, onde Woody Allen nos coloca questões importantes. A de saber se há moralidade num  mundo sem Deus? Se existe algo que nos obriga a observar a Lei, se há alguma forma de impedirmos uma vida amoral, onde a sorte responde por si só ao que vai acontecendo? As duas figuras encontram-se no final e esse encontro é uma visão sobre a própria vida. Sob a influência de Ingmar Bergman e de algumas imagens de "Morangos Silvestres" de 1957, Woody Allen faz com Crimes e Escapadelas um dos seus grandes filmes, uma narrativa sobre o crime sem castigo, tema que abordará mais tarde nos filmes Match Point ou Cassandra.O filme foi apreciado pela crítica e pelo público, tendo recebido três nomeações para os Óscares.

Selma é um filme de 2014 realizado por Ava Duverney e que retrata o papel de Martin Luther King na luta pelos direitos civis na América, nomeadamente em 1965. Trata-se da marcha no Alabama entre Selma e a capital do estado, Montgomery e representa um dos momentos altos da cidadania americana e da História Contemporânea. Selma é a representação cinematográfica de uma marcha que envolveu milhares de pessoas, na luta pela igualdade de direitos, por parte da comunidade negra. A marcha foi essencial para a aprovação da Lei dos Direitos ao Voto pelo presidente Lyndon B. Johnson e uma conquista incrível para os indivíduos de raça negra. É um filme que mostra esse momento único de construção do sufrágio universal, na América congregando pessoas num direito que superava educação, condição social ou a própria raça. Selma é um filme que nos oferece um documentário para um momento essencial da História Contemporânea. O filme recebeu duas nomeações para dois Óscares.

Das palavras de Vergílio (XIII)

Viver é tão relativo como o belo. Não posso estar viva se não tenho razões para viver, apenas sobrevivo. Estar vivo é difícil, viver é difícil. A maioria das pessoas apenas sobrevive neste mundo. Ficam presas à rotina e não contemplam o que a Terra tem de melhor. Um ator, de que eu gosto muito, ensinou-me que devemos aproveitar a vida ao máximo, "sugar o tutano da vida", aproveitar o dia como se fosse o último - "Carpe diem".Eu  estou vivam eu vivo cada dia como se fosse o "úktimo dia bom". O sentido da vida é encontrar a razão para a viver.

Marta, "Estar vivo", 10º C2

Das palavras de Vergílio (XII)

Todos nós pensamos. Todos os dias pensamos sobre as coisas que nos rodeiam. A dúvida consiste naquilo em que pensamos. Na forma como interpretamos o nosso pensamento e o pensamento dos outros. Mas será que o pensamento nos leva a uma conclusão direta? Por vezes não. Por vezes o pensamento leva-nos a não encontrar uma conclusão, leva-nos a um mistério, a uma indeterminação.

Inês, "Pensar o quê?", 11º C2
Imagem: Copyright - Azuto

Das palavras de Vergílio (XI)

Afundando-me na minha profunda tristeza e procurando aquela felicidade que nunca conheci, olhando para o céu azul e ouvindo a música do país frio, tendo esperança que um dia consiga libertar-me da minha solidão, tendo consciência que o meu desejo mais forte pode não ser razoável, olhando para o céu azul e ouvindo a música do país frio, penso que um dia aparecerá um fabuloso sorriso, bem carinhoso. Nesse dia, o meu desejo mais forte será realizado e sairei da minha profunda solidão.

Rugiatu, "A solidão", 10º C2

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Novidades na Biblioteca - Livros (II)

  
Como um Romance de Daniel Pennac, é um pequeno livro que nos traz o tema da leitura, o seu processo, a sua magia e a dificuldade em converter muitas vezes os jovens em leitores. Como um Romance é uma pérola que identifica alguns dos erros que se cometem para fazer leitores e nos conduz a casa; aos amigos e à escola. Identifica-nos os direitos inalienáveis do leitor, a fim de rotinar leitores em compreender melhor a sua individualidade enquanto tal, explicando-os. Como um Romance é sobre essa ciência quase oculta de "levantar" as palavras, o processo da leitura. O livro está organizado em quatro capítulos (I. Nascimento do Alquimista; II O Dogma da leitura; III. Dar a Ler e IV. O que leremos) e desperta-nos para a verdadeira necessidade que temos de que as escolas sejam locais onde se aprenda a ler e onde se ame a leitura. O gosto pela palavra descoberta é em muitos casos mais importante do que a verificação formal de um texto como trabalho de investigação/interpretação?

A intimidade perdida...
Neste princípio de insónia, repenso o ritual da leitura, todas as noites, à cabeceira da cama, quando ele era pequeno, a horas fixas e com gestos imutáveis: era de certo modo como uma oração. O súbito armistício depois da balbúrdia do dia, os reencontros livres de todas as contigências, o momento de silêncio concentrado antes das primeiras palavras da história, a nossa voz que finalmente soa como de facto é, a liturgia dos episódios... Sim, a história lida todas as noites constituía a mais bela função da oração, a mais desinteressada, menos especulativa, a que dizia respeito apenas aos homens: o perdão das ofensas. Não se confessava nenhuma falta, não havia qualquer preocupação em receber uma porção de eternidade, era um momento de comunhão entre nós, a absolvição do texto, um regresso ao único paraíso que tem valor: a intimidade. Sem que o soubéssemos, descobriríamos uma das funções essenciais do conto, e mais generalizadamente da arte em geral, que é impor uma trégua no combate entre os homens.
O amor ganhava um rosto novo.
Era gratuito.

A Casa de Papel de Carlos Maria Domínguez, é outro pequeno livro sobre os livros e a leitura. A Casa de Papel fala sobre esse universo de pessoas que habitam nos livros, cujas vidas se cruzam com livros e que estão marcadas pela paixão misteriosa e inexplicável da leitura. Os livros podem influenciar-nos na nossa própria vida, no real que habitamos. Livro de dimensões reduzidas acaba por ser uma metáfora sobre a leitura e aquilo que um livro nos pode dar, nos espaços de silêncio. Livro que nos interroga sobre fronteiras, a loucura e a normalidade e que nos diz que uma Biblioteca, a nossa Biblioteca é um conjunto de realidades emocionais, muito maior que o somatório de um conjunto de livros.

No Meu Peito Não Cabem Pássaros oferece-nos a leitura de vidas afastadas no espaço e congregadas pelo tempo que vivem. Partindo de um episódio real, a passagem de dois cometas pela Terra, Nuno Camarneiro dá-nos uma visão da vida vivida por três destacadas e muito importantes figuras da Literatura, Fernando Pessoa, Jorge Luís Borges e Franz Kafka. Três figuras, entre as suas cidades na visão de superar o quotidiano e construir a imortalidade de um caminho feito dos sonhos que nos transbordam. A vida, a memória, as palavras, a morte e o esquecimento, entre os caminhos que percorremos, com o sol a nascer em nós. A infância, o consolo das histórias vividas e inventadas entre os que no tempo forjaram o azul de um aconchego e nos deram a visão de um caminho. No Meu Peito Não Cabem Pássaros é um grande livro, uma sabedoria de palavras, momentos intermitentes que nos trazem a linha dos olhos que procuramos para recuperar a beleza, o encontro com a respiração do amor que nos faça ser um ponto brilhante nos dias esquecidos. A beleza e o sorriso entre as cicatrizes que nos caracterizam, que nos rasgaram o espírito e o corpo até chegar a um encontro, ao perfume solar capaz de nos fazer render um novo salto, a dos pássaros que em nós voam.

O mundo é um vazio desmedido que não queremos nem podemos aceitar, os homens também, as cidades, os países, os planetas também. Não há palavras que encham tanto vazio. Os livros que deixamos são obras de filigrana, fios ténues do sentido com que delimitamos o volume do que não entendemos.

Novidades na Biblioteca - Filmes (II)

   
Out of Africa, na tradução portuguesa África Minha, é um filme de 1985, com realização de Sidney Pollack, que obteve sete Óscares: Melhor Filme, Melhor Realizador, Melhor Argumento, Melhor Fotografia, Melhor Banda Sonora Original, Melhor Direção Artística e Melhor Som. Com a participação, nos papéis centrais, de Meryl Streep, Robert Redford e Klaus Maria Brandauer, relata a história de uma mulher de grande coragem, no coração de África. Narrativa de um recomeço de vida, na gestão de uma plantação de café do Quénia, de Karen Blixen e do barão Bror Blixen. Narrativa da colonização europeia de África, conta o imenso romantismo que atraiu pessoas a outra forma de vida. Narrativa de grande beleza, da força de uma mulher, das suas mágoas, das suas memórias e de um amor perdido. África Minha é um dos mais belos filmes sobre África.

Dead Poet Society, na tradução portuguesa O Clube dos Poetas Mortos, é um filme de 1989, realizado por Peter Weir e com a participação muito especial de Robin Williams, no papel do professor John Keating. Este personagem é acompanhado por um grupo de alunos, onde podemos destacar Robert Sean Leonard, Ethan Hawke e Josh Charles nos papéis de Neil Perry, Todd Andersen e Knox Overstreet respetivamente. O Clube dos Poetas Mortos é uma narrativa sobre o valor da escola e das escolhas pessoais de cada um e como elas podem influenciar uma vida com significado. A liberdade de pensamento e de expressão, o valor da poesia para reclamar a essência humana, o amor e a beleza, tudo faz deste filme um objeto grandioso. O clube dos Poetas Mortos é um grito pelo tempo em que estamos vivos, pela nossa capacidade de acrescentar na vida com os outros um sentido com significado. Um filme para qualquer geração compreender o seu papel e as possibilidades do seu legado nos dias e na vida.

Patch Adams é mais um filme com uma representação notável de Robin Williams. realizado em 1998, realizado por Tom Shadyac, relata-nos a história de vida de Patch Adams, o homem que descobriu num sanatório que queria ser médico para ajudar os outros. Filme de grande sensibilidade sobre o amor, sobre a sua influência no modo como a doença e o cuidado aos outros pode ser determinado por atitudes mais humanas. Num papel que nos leva do choro ao riso, à ternura íntima por quem se despede da vida, o filme lembra uma figura que daria mais tarde corpo a um Instituto e a um movimento que nos Estados Unidos incentivaria a importância do sorriso para criar nos doentes uma força anímica suplementar para superar as suas doenças. O nariz vermelho, ou "os doutores palhaços" que mais recentemente chegaram à Europa, conduz esta ideia de promoção de um bem-estar anímico para superação de dificuldades físicas de grande dificuldade.
Com O Clube dos Poetas Mortos e Patch Adams Robin Williams deixou-nos dois papéis em que quase se confundiu com personagens que vivem a vida com um sentido de beleza que certamente inspiraram milhões. Um filme de grande valor pedagógico e disponível nas novas aquisições da Biblioteca. 

Das palavras de Vergílio (X)

O silêncio estala no ar branco, os pássaros calam-se na sombra das ramadas. O silêncio da noite, o momento verdadeiro, pensativo, tranquilo. A ausência de som e a presença de humanidade, de pensamento. O silêncio no qual apenas se ouve a voz da terra, do profundo interior, do espírito, da verdade, da divindade do homem. Este breve momento no qual o sujeito é completamente íntegro. Reflete, julga, interpreta-se. Procura a autenticidade e a procura de respostas. O silêncio da noite é o que nos faz ser realmente humanos, racionais e ter sentimentos.

Inês, "Silêncio da noite", 11º E2; Imagem - © : ambientwalrus

Das palavras de Vergílio (IX)


Thinking specifically over-thinking. can lead to many problems. Thinking too much can cause you to believe those who love you don't love you, believe you can't do something that is within your capability, or believe that you are not good enough. It can also, however, lead to amazing discoveries or inventions. The only way thinking is troublesome is if you it incorrectly. Do not dwell on things you can´t change and change the things you can.

Chalyn, "The touble of thinking", 11º A1
Imagem - Copyright: http://www.rgbstock.com

Das palavras de Vergílio (VIII)

Uma das principais ferramentas do ser humano é o ato de pensar. Desenvolvemos o nosso raciocínio, abrimos o nosso horizonte e não ficamos tão "fechados" no nosso pensamento e, de certa forma, o diálogo ajuda-nos a libertar e a partilharmos as nossas ideias com o mundo. Agora, quantas vezes o pensamento já foi o nosso inimigo? Virou-nos as costas quando mais precisávamos. Ficámos baralhados com o excesso de palavras que flutuam na nossa mente, e deixamos que elas tomassem conta de nós. Muitas das vezes não é necessário pensar muito, deixar apenas que a nossa fé e alma tomem o rumo da nossa vida, pode ser um dos pilares para a nossa felicidade.

Mariana, Não penses muito", 11º A1
Imagem - Copyright: Inna Blar

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Das palavras de Vergílio (VII)

A solidão é algo inexplicável, quando se sente.
É o cansaço.
É abandono.
Nada parece real.
Parece um breve momento.
Nunca acaba.
É uma sala escura. Por entre a ranhura da porta vê-se um risco de luz, como se estivéssemos presos num canto.
Como se abríssemos a boca, mas nada saísse.
Ninguém que nos ouve. Estamos sós.
É um beco sem saída, sem rumo, sem sentido.
É o desespero total, é a alma vazia. É um buraco sem fim, onde caímos na tentação de procurar a felicidade. 
Caímos, e não batemos no fundo. Caímos, caímos, mas nada parece funcionar. 
Não nos sentimos como antes, estamos sem a doce voz que nos conforta antes de dormir.
É a falta de integração.
É uma sociedade distante.
É um sorriso baço e desfocado.
São olhos penetrantes.
É uma estrada com curvas sem fim.
A consciência está num ciclo sem fim.
Nada faz sentido.
Estamos sós.

Mercês, "A solidão", 10º C2

Das palavras de Vergílio (VI)

Não penses muito num mundo onde o pensar não te ajuda, não te une,... Não penses muito num tempo onde um porquê básico completa o teu desejo, te guia... Utiliza essa capacidade, essa atitude, essa garra, para mudar o que ainda não mudaste, fazendo o que ainda não fizeste e, talvez, atingir aquilo que ainda não atingiste. Usa essa "digestão" da tua mente para resolver o que precisa de ser resolvido, para o que se apresenta como realmente importante, ultrapassando "as pequenas pedras" que te impedem de começar e te obrigam a pensar no que não precisa de ser pensado, segue o "não penses muito" e pensa só no que verdadeiramente importa, pensa por ti.

João Saúde, "Não penses muito", 10º C2
Imagem: © – m-ban. – 白の習作。

Matilde Campilho - A Escrita das palavras

Há palavras que se encontram como formas de viagem, sons de ideias à nossa espera, desejos expostos do mundo, para os reencontrarmos na nossa pele, no sorriso dessas sílabas à deriva no mundo. Essas palavras são a nossa composição de pequenos fragmentos,  a permanência de uma eternidade que deixamos em momentos informais e naquilo que descobrimos e amamos.
A escrita nasce assim da nossa experiência viva, das nossas indecisões, dos caminhos percorridos, de como a chuva nos transporta a imaginários sonhos ou como o sol nos inunda com as suas atmosferas de luz. 
Matilde Campilho tem uma escrita que nasce e desenvolve-se nesta forma de escrever como a vida nos surge, nos descreve no que sentimos e exploramos. Depois do destaque como livro da semana na Biblioteca, um vídeo sobre essa graça natural de viver entre as palavras. Uma apresentação digital sobre essa construção das palavras em nós, um retrato de uma jovem e a sua redescoberta nessas formas de expressão que exprimem espaço e desejo, uma construção habitada de paisagens vastas e belas.

Jóquei - Livro da semana

Título: Jóquei
Autor: Matilde Campilho
Edição: ..ª
Páginas: 
Editor: Tinta da China
ISBN: ...

CDU: ...
Sinopse:
Não sou de choro fácil a não ser quando descubro qualquer coisa muito interessante sobre ácido desoxirribonucleico. Ou quando acho uma carta que fale sobre a descoberta de um novo modelo para a estrutura do ácido desoxirribonucleico, uma carta que termine com “muito amor, papai”. Francis Crick achou o desenho do ADN e escreveu a seu filho só para dizer que “nossa estrutura é muito bonita”. Estrutura, foi o que ele falou. Antes de despedir-se ainda disse: ” Quando você chegar em casa vou-te mostrar o modelo”. Isso não esqueça os dois pacotes de leite, já agora passe a comprar pão, guarde o resto do dinheiro para seus caramelos, e quando você chegar eu te mostro o mecanismo copiador básico a partir do qual a vida vem da vida. 
Não sou de choro fácil mas um composto orgânico cujas moléculas contêm as instruções genéticas que coordenam o desenvolvimento e funcionamento de todos os seres vivos me comove. Cromossomas me animam, ribossomas me espantam. A divisão celular não me deixa dormir, e olha que eu moro bem no meio da montanha. De vez em quando vejo passar os aviões, mas isso nunca acontece de madrugada – a noite se guarda toda para o infinito silêncio. Algumas vezes, durante o apuramento das estrelas, penso nos santos que protegem os pilotos. Amelia Earhart disse que não casaria a não ser que fosse assinada uma tabela de condições e essas condições implicavam a possível fuga a qualquer momento.” I cannot gurantee to endure at all times the confinements of even an attractive cage”.
 Vai passarinho. Soube de uma canção cujo refrão dizia I would die for you, fiquei pensando que mais de metade das canções do mundo dizem isso mas eu nunca entendi isso. Negócio de amor e morte, credo. Lá na escola eles ensinavam que amor são sete vidas multiplicadas, então acho que amor é o contrário do fim. Sei lá, o mundo está mudando tanto. Não sou de choro fácil a não ser quando penso em determinados milagres que ainda não aconteceram. Meu time ganhou por três a dois. O maior banco norte-americano errou, e errou em muitos milhões. Ninguém chegou a falar do aniversário do Superman, e isso também conta como erro.
 Faltam seis dias para a Primavera, está tendo uma contagem comunitária na aldeia mais próxima daqui. Acho que está chegando a hora do sossego, e que muita alegria vai pintar por aí. Acho que uma palavra é muito mais bonita do que uma carabina, mas não sei se vem ao caso. Nenhuma palavra quer ferir outras palavras: nem desoxirribonucleico, nem montanha, nem canção. Todos esses conceitos têm os seus sinónimos simplificados, veja só, ácido desoxirribonucleico e ADN são exatamente a mesma coisa, e o resto das palavras você acha. É tudo uma questão de amor e prisma, por favor não abra os canhões. Quando Amelia Earhart morreu continuava casada com Putnam – suspeito que ela deve ter visto rostos incríveis nas estrelas. Que coisa mais linda esse ácido despenteado, caramba. Olhei com mais atenção o desenho da estrutura e descobri: a raça humana é toda brilho.
Matilde Campilho. “NOTÍCIAS ESCREVINHADAS NA BEIRA DA ESTRADA”. Jóquei. Tinta da China. 2015, p. 21-22.

Das palavras de Vergílio (V)

Silêncio da noite, quando tudo é nada.
É no silêncio da noite que te soltas, é nesse silêncio que por nulos segundos tu és tu. 
É nesse silêncio que tu te ouves, que te fazes sentir.

No silêncio da noite consegues sonhar, consegues pensar, sem que te seja criticado alguma coisa.
É no silêncio da noite que falas com quem te ouve mas não te vê, é nesse silêncio que essas pessoas são o teu meio mais reconfortante.

No silêncio da noite fazes as tuas maiores decisões e tens as tuas melhores ideias.
Silêncio da noite, este que me ouve.

Maria, "Silêncio da noite", 11º A1

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

O tempo longo - memória de Manuel Laranjeira

"[...] Não compensar o trabalho é aniquilar o estímulo de trabalhar. E até certo ponto, se não é justo. É pelo menos explicável, que homens, que em outro meio seriam prodigiosas fontes de riqueza e de progresso, respondam invariavelmente aos que os incitam a fazer alguma coisa: "Não vale a pena".

Ontem, passou mais um ano sobre o desaparecimento físico de um homem que conviveu com o modernismo e fez dele, com Amadeo de Sousa Cardozo, uma forma possível de modernidade num País velho e cinzento. O tempo longo é uma das suas mais importantes características, ao lado desse desfile de figuras tão nobres e vitais, que foram dispensadas de participar. De Sá de Miranda, a Bento de Jesus Caraça, de Torga a Pessoa, de Bento de Jesus Caraça a Agostinho da Silva, muitos ficaram presos na sua genialidade, dentro de um país que apenas respira, forma eufemística, para a expressão de Eça, "existe apenas".

Manuel Laranjeira, enquadra-se num movimento cultural autónomo dos homens que como Antero, Soares dos Reis, Torga, Ramalho Ortigão, Afonso Lopes Vieira ou Teixeira de Pascoaes souberam pensar as realidades sociais para melhor compreenderem o que faz as sociedades evoluírem e o que as paralisa, que movimentos as congelam e o que as transformam. Manuel Laranjeira é associado a uma ideia de pessismismo nem sempre bem enquadrada, pois o que o movia era a compreensão dos elementos que não faziam do país um lugar entre as nações desenvolvidas. Laranjeira nasceu em São Martinho de Moselos, em 1877, num lugar próximo de Santa Maria da Feira e faleceu em Espinho a 22 de Fevereiro de 1912. Portador de uma neurastenia crónica, o seu pensamento e a procura de um sentido para o país fez-lhe traçar um caminho de pessimismo, que Miguel de Unamuno viria a traduzir na sua célebre formulação de um povo suicida, no seu livro por Terras de Portugal Y de España.

Laranjeira encontraria neste pessimismo muitos dos pontos que Eça já tinha trazido à luz do dia, nomeadamente com as crónicas do Jornal de Évora, sobre uma classe política incapaz de compreender o país e a sua função e uma população analfabeta, num país que proclamava valores de um tempo e de uma civilização que não vivia. Continuamos fora dessa civilização que se pensa a si como um futuro de possibilidades, que não seja apenas obedecer a directórios não eleitos.

Laranjeira era natural de um meio modesto, mas por apoio de um tio pode estudar, tendo-se formado em Medicina. Dotado de um grande saber para o seu tempo, conciliou diferentes interesses e nos seus escritos encontramos abordados temas que vão da religião, à política, à literatura ou às artes. Laranjeira teve uma influência muito importante em Amadeo de Souza Cardoso e na sua ida para Paris para estudar desenho. Viria a publicar diferentes textos em periódicos como A Revista Nova, A Voz Pública, ou ainda, O Norte. 

A doença, as ideias de uma geração sobre a decadência do país, o isolamento cultural dos intelectuais ou dos que pensavam a realidade nacional, o afastamento de Portugal dos cenários de desenvolvimento e de enfoque internacionais construiriam um pessimismo de vida que o levaria cedo, numa atitude  violenta que outros também praticaram. Manuel Laranjeira é uma importante figura do pensamento oitocentista e do início do século e em muitos aspectos ele é profundamente actual.

Há neste livro e na sua obra a construção dos elementos culturais e sociais que impedem o País de ser um espaço de desenvolvimento pessoal para os seus cidadãos. O seu diagnóstico sobre a irrelevância dada ao trabalho como capital, a inteligência não colocada ao  serviço da construção de ideias que suportem acções de valor para o homem no seu quotidiano, o afastamento das classes políticas pelo que é justo, pelo território, pela identidade cultural das pessoas recoloca a importância de Manuel Laranjeira no pensamento cultural do início do século. No movimento dos que ousaram pensar por si, e que veicularam um modernismo único, o de transformar o futuro, que é o presente de todos os dias.

Concurso nacional de Leitura - fase distrital (Ensino Secundário)

 

Obras escolhidas para a fase final do Concurso Nacional de Leitura, para os alunos do secundário.
O ano sabático de João Tordo, editado pela Dom Quixote.
Flores de Afonso editado pelas Companhia das Letras.

Concurso nacional de Leitura - fase distrital (Ensino Básico)

O concurso nacional de Leitura na sua 10ª edição, a realizar no dia 6 de abril na Biblioteca Municipal da Lourinhã escolheu para a fase distrital os livros abaixo indicados:

A alvorada dos deuses, de Filipe Faria, editado pela Presença. 
A cruz vazia de Maria Teresa Maia Gonzalez, editado pela Difel e também pela Arcádia.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Umberto Eco - In memoriam


No passeio das tílias

A casa onde às vezes regresso é tão distante
da que deixei pela manhã
no mundo
a água tomou o lugar de tudo
reúno baldes, estes vasos guardados
mas chove sem parar há muitos anos

Durmo no mar, durmo ao lado de meu pai
uma viagem se deu
entre as mãos e o furor
uma viagem se deu: a noite abate-se fechada
sobre o corpo

Tivesse ainda tempo e entregava-te
o coração. (1)


 Foi há seis anos que a Madeira amanheceu com um aluvião que levou na corrente sonhos, memórias e quotidianos. Nas palavras e no coração as memórias de uma paisagem humana que foi preenchida pelos nossos sonhos, mesmo agora que a tragédia nos faz duvidar das paredes e dos aromas que aqui experimentámos. Fernando Alves, com a magia e a sabedoria de quem olha com espanto o real que nos é dado a viver, deixa-nos um podcast que dispensa apresentações. A ouvir como uma oração. Aqui.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Das palavras de Vergílio (IV)

É durante a noite que o mundo cai a nossos pés, quando a perceção da vida nos aparece clara e distintamente. É na paz do silêncio que nos encontramos e encaramos a vida, aquilo que temos de enfrentar. No silêncio da noite, quando estamos sós, podemos pensar e temos a oportunidade de sentir com mais intensidade. Não existem distrações. 

Existimos apenas nós e a nossa vida: as mágoas, os arrependimentos, as tristezas sem fim; o que a vida representa para nós e a oportunidade de nos guiarmos através dela.
Existem as nossas ações e os nossos sonhos.

É no silêncio da noite que ganhamos coragem e que podemos ser nós próprios, tomar as nossas decisões. É no silêncio da noite que nos apercebemos da realidade e de tudo o que perdemos. É também no silêncio da noite que compreendemos a nossa felicidade e o que a vida nos ofereceu.

Catarina, "Silêncio da noite", 11ºC1
Imagem: Copyright - Beyond-Somewhere


Das palavras de Vergílio (III)

Na noite o silêncio é mais puro.
(...) "Silêncio da noite",11º C1; Imagem - Noite estrelada - Vincent van Gogh

Das palavras de Vergílio (II)

Ouço. Não quero pensar. Não me apetece. Pensar implica empurrar a inércia para longe, e a inércia é muito pesada. Mas o pensamento também pode entrar-nos pelos ouvidos. É bem mais fácil assimilá-lo na alma depois. 
A Natureza, rainha do Universo, impinge uma regra ao mundo natural: "aquele que faz o mais possível a partir do menos possível deixará o seu legado para o futuro." É a lei do menor esforço. Usar a própria alma para produzir o pensamento, um pensamento original implica empurrar a inércia, e a inércia é muito pesada. Que se ouça e se assimile na alma o produto dos outros! 
Ao parar e escutar, sou capaz de possuir o pensamento. E não gasto a minha alma no processo. Imagino um mundo ideal, sem artistas, sem escritores, em que apenas um homem se sacrifica, pensa, e dá o seu pensamento a todos. E todos seguem o seu pensamento.
Assim pensam os que não pensam.

José, "Ouço, não quero pensar",10ºC1; 
Imagem - Copyright: Krzysztof Karpinsky

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Jorge Amado - escritor do mês

 

Cacau de 1933, inauguraria uma temática que entre os anos quarenta e oitenta serviriam de matéria-prima para as obras de Jorge Amado, o cacau como suporte de uma organização social, económica e política. Terras do sem-fim (1943), São Jorge de Ilhéus (1944), Gabriela cravo e canela (1958), Tocaia Grande (1981) e O menino garapiúna(1988) completam um ciclo de livros pensados e alimentados no sul da Baía, os seus grupos humanos, as suas fontes de poder, a sensualidade dos trópicos discutindo o papel da mulher e  de como novas ideias eram permeáveis a formas de colonização da terra. 

Especialmente em Terras do sem-fim, um dos seus livros mais importantes ao lado de São Jorge de Ilhéus, descreve-se a formação do cacau como uma indústria e como se dá essa luta pela terra e de como surgem pequenas cidades no sul da Baía, já no início do século XX. Neles, como em Gabriela cravo e canela, surgem-nos o universo dos coronéis, os critérios do seu estatuto político e económico e as figuras obedientes que suportam esse poder, os jagunços. Nestas obras Jorge Amado dá-nos uma geografia humana e cultural, a Baía colocando sempre a literatura como um património e uma forma, um instrumento de combate perante as formas mais simplistas de viver em comunidade. 

Jorge Amado parte de um local, da sua caracterização para chegar ao universal e aos modos de exploração da vida humana no seu sentido mais global. A esperança por novos territórios que eram difíceis de conquistar e que implicavam uma luta árdua, sobre-humana para sobreviver. Os aromas, a culinária, as formas de ser, o amor entre figuras à procura de um sentido num universo violento. Tudo isso faz de Jorge Amado um autor maior, que fez de particulares formas, um olhar ao universal. Isso faz dele um autor para todos os tempos. 

Jorge Amado escreveu sobre a antropologia das cidades e dos locais que tentava compreender. Esse significado autêntico sentido pelas pessoas, à procura de uma palavras substantiva e ao mesmo tempo bela. Era essa a sua forma de se encontrar com as pessoas e de no real ser preenchido pelos vivos e pelos ausentes que aqui deixaram as marcas de muitas vidas. Jorge Amado pertence à galeria dos eternos. Um dia ele vem por aí, com a sua linguagem própria e palavras a definir as personagens de uma cumplicidade, feita literatura. 

Das palavras de Vergílio (I)


Pensar. Pensar o quê, porquê, quem, como...?

Pensar porque sim ou pensar por pensar?
Pensar porque pensar faz parte de nós, pensar é estar vivo.
Pensar no que fazemos, queremos, temos, sentimos, tudo na nossa vida nos faz pensar, porque desperta este sentido, o sentido do pensamento, aquele que muitos consideram importante. (muitos não, mas até para chegar a essa conclusão precisam de pensar). O pensamento é essencial! Descreve cada um de nós, vai para além da realidade superficial e materialista, define quem somos emocionalmente, como um bilhete de identidade para as nossas emoções, opiniões. O pensamento não se baseia "no quê", pensamos porque pensar é viver.
Pensar para quê?
Para mostrarmos no mundo que estamos vivos, para nos mostrarmos a nós mesmos que estamos vivos, que somos alguém, que algo em nós não tem limites, não sem oposições nem arrependimentos, deixando a liberdade no pensamento, estamos a valorizá-lo, a afirmar que este não é determinado, é da nossa responsabilidade - conduzir o pensamento ao longo deste caminho que é a vida.

Inês, "pensar o quê?", 10ºC2
Imagem - O pensador de Rodin

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Carta ao futuro (II) - Livro da semana


Título: Carta ao futuro
Autor: Vergílio Ferreira
Edição: ..ª
Páginas: 
Editor: Quetzal
ISBN: ...

CDU: ...
Sinopse:
“O que há a redimir é a fulgurante evidência da nossa condição, mediante uma outra evidência absoluta que a aceite em harmonia, em plenitude
O que há a redimir é a adequação deste milagre brutal de nos sabermos uma evidência iluminada, de nos sentirmos este ser que é vivo, se reconhece único no corpo que é ele, na lúcida realidade que o preenche, o identifica nas mãos que prendem, na boca que mastiga, nos pés que firmam, de nos descobrirmos como uma entidade plena, indispensável, porque ela é de si mesma um mundo único, porque tudo existe através dela e é impossível que esse tudo deixe de existir, porque ela irrompe de nós como a pura manifestação de ser, e o “ser” é a única realidade pensável –  o que há a redimir é a adequação desta fantástica evidência que nos cega e a certeza de que ela está prometida à morte, de que o seu destino é a impossível e absoluta certeza do não-ser, da pura ausência, da totalidade nula, da pura irrealidade. 

Colaborar com a vida, aceitar a validade de uma norma, forjar uma regra para a distribuição da nossa ação e interesse –  sim. Mas é impossível, antes disso, desviarmos os nossos olhos de fascinação da vertigem, e vermos, vermos bem, de que fundas raízes gostaríamos de entender tudo quando realizássemos. É uma tentativa absurda, meu amigo, toda a gente no-lo diz –  toda a gente que desconhece essa força que nos fascina. Mas eu sei que só se é homem, plenamente, quando se sabe 

A escala de tudo quanto povoa a terra estabelece-se-nos aí, no saber. A ilusão da plenitude, a ficção de uma quotidiana divindade. Essa que se define por uma certa instalação na permanência, forja-se apenas de uma inconsciência animal. Somos homens, não somos deuses nem pedras. Se a grandeza que nos coube foi essa ao menos de saber, conquistemo-la até onde, nos limites das evidências primeiras, ela se nos anuncia. E se o “absurdo” é a face desses limites, assumamo-lo como quem não rejeita nada do que é ainda nós próprios. A cobardia não está em assumir esses limites, mas em recusá- los. (…)

 Vergílio Ferreira. Carta ao Futuro. Quetzal.