A
pintura holandesa do século XVII é um momento de grande significado na arte
europeia e mundial. É um a arte que representa instantes de silêncio, momentos
do quotidiano e que nos convida a entrar num mundo emerso em valores que nem
sempre compreendemos, pois referem-se a pessoas que conduziram uma das
excepções do século XVII, a Holanda do comércio marítimo.
É
uma arte que funciona como um enigma, uma espécie de parênteses que se
organizou fora do próprio tempo e que quase esquece os meios e as relações onde
nasceu. O museu do Louvre em Paris inaugura este mês uma exposição sobre essa
luz nórdica que o século XVII holandês tão bem soube definir, essa construção
do artista no interior do quotidiano, os seres no interior do silêncio.
A
pintura holandesa do século XVII retrata-nos uma população plena de um sentido
existencial e que parece muito cativada para as artes e que faz da
representação na pintura um corpo narrativo da própria existência, onde
encontramos formas honestas, ao mesmo tempo que fortes de uma alegria que se
evidencia por si própria. Os retratos desta pintura são a reprodução das
diversas possibilidades que as cidades, as habitações, os interiores, uma
felicidade doméstica, as crianças, as mulheres parecem nos querer contar.
Retratos de espaços de intimidade, dos momentos festivos do quotidiano, da
bravura de marinheiros e comerciantes e de um comércio que correu
oceanos.
A
pintura holandesa do século XVII revela-nos como os impérios são feitos em
breves momentos por espaços particulares e de como a genialidade holandesa
conseguiu em meio século dar um sentido pragmático e belo a uma entidade material
e social. Essa pintura procurou um sentido representativo da vida real, dando-a
como ela se oferecia aos cidadãos, revelando as próprias formas de
enquadramento dos objectos da natureza. Para esse feito um conjunto de artistas
usou técnicas de utilização da cor que nos deixam ainda hoje em estado de
admiração. Técnicas de utilização da cor, sem dúvida, mas também da luz,
construindo um quadro de perfeita beleza, onde a cor se assume como uma das
suas referências.
A pintura do século XVII revela-nos ainda algo antes da técnica. A representação das características das coisas, a identificação dos seus nomes pela forma como elas se enquadram no quotidiano. Há nesta pintura de um modo muito vivo "um grau de verdade e de perfeição que não pode ser ultrapassado" (1). Ela representa uma forma de abandono aos instantes da vida, mas também é ao mesmo tempo um momento ideal, de algo profundamente essencial e vivo na vida dos cidadãos. Há nesta pintura, uma construção de uma felicidade na vida que possa erradicar as ideias do mal que possam surgir, como surpresa irrefletida das coisas. Existe um humanismo nesta luz do norte e ficamos a pensar, de que modo o Calvinismo tão pragmático, foi um condutor para esta procura de uma felicidade no instante e no silêncio das coisas.
(1) - Georg Wilhelm Friedrich Hegel. (1993). Estética. Lisboa: Guimarães Editores.
Imagem: Vermeer, vista de Delft, 1666-1661, Mmauritshuis, Haia, Holanda.
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