Texto 1: "A biblioteca protege da hostilidade exterior, filtra os ruídos do mundo, atenua o frio que reina em volta, mas confere, igualmente, uma sensação de omnipotência. Porque a Biblioteca faz recuar as pobres capacidades humanas: ela é um concentrado de tempo e de espaço. Reúne nas suas prateleiras todos os estratos do passado. Ali estão os séculos que nos precederam. ("A escrita (...) grande, muito grande ao permitir-nos conversar com os mortos, com os ausentes, com aqueles que não chegaram a nascer, através de todas as distâncias do tempo e do espaço", Abraham Lincoln).
O passado assombra as bibliotecas, não apenas nos testemunhos de época, mas também nos estudos eruditos, nas reconstituições literárias e nas imagens de todos os tipos. Mas a minha biblioteca é também uma concentração de espaços. Reúnem-se ali todas as regiões da Terra, os cinco continentes com as suas paisagens, os seus climas, a sua maneira de viver. (...) Posso deslocar-me para qualquer um destes sítios num segundo, saltar de um para o outro e até ficar em dois deles ao mesmo tempo.
Há nisto qualquer coisa de divino, e eis sem dúvida a razão por que, quando se fala de bibliotecas, é tão tentador utilizar uma linguagem religiosa. Borges disse-o: "A Biblioteca é uma esfera cujo verdadeiro centro é um hexágono algures, e cuja circunferência está inacessível." E Umberto Eco a enunciar a ideia bizarra: "Se Deus existisse, seria uma biblioteca." Uma ideia que terá que ver com a capacidade de dominar, em certa medida, tanto o tempo como o espaço."
Bonnet, Jacques. (2010). Bibliotecas cheias de fantasmas. Lisboa: Quetzal.
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