"Se queremos escrever livros a sério temos que aspirar ao silêncio e encher os livros de silêncio. O leitor lê as palavras que não estão lá escritas e no entanto estão lá. O que os livros tratam todos é de uma paisagem interior. E é por isso muito difícil falar deles. É sempre a mesma busca.
Primeiro a angústia do homem no tempo e depois uma procura de si, da natureza do homem. Penso que os livros são todos isto. Muitas vezes não é um trabalho de elaboração prévio à escrita. É a própria escrita que vai moldando a estrutura do livro. O livro é feito de palavras. São as palavras que vão moldando. E só assim podem carregar com elas as emoções. E os grandes livros são são serão livros doentes?
Este livro é triste. É idiota dizer isto, porque quando a mão é feliz, o livro é uma alegria para o leitor. Ou quando falam em intriga. Não há intrigas. As pessoas dizem vou contar uma história. Não vão contar história nenhuma. Os romances maus contam histórias. Os romances bons mostram-nos a nós mesmos. Talvez seja isso. Um mau romance é aquele que conta uma história.
Escrever é uma coisa muito difícil. O ideal é que o livro fosse encontrar um deserto com vozes. Reduzir as coisas à pedra de que somos feitos. D. Manuel José de Melo (autor do século XVII) dizia "o livro trata do que vai escrito nele". É isso. É o livro que manda, não é o autor.
Temos perguntas, mas não temos respostas. E quando soubermos as respostas, Deus muda as perguntas. A nossa vida é uma pergunta perpétua. Os livros são perguntas que trazem respostas, muitas vezes às perguntas que não fizemos. Goethe dizia que "o não chegar é que faz a nossa grandeza". E como escritor de livros é isso que sou: um principiante".
Jornal das Nove, SIC Notícias, 2012
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Good book by Julianna Collet Photography
Escritaria 2012 - Homenagem a António Lobo Antunes (Napoleão Monteiro)
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